O ministro Nunes Marques pediu vista (mais tempo para analisar o processo) e com isso adiou a conclusão do julgamento na Segunda Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a suspeição do ex-juiz Sergio Moro na condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Os cinco ministros da turma estão decidindo se Moro agiu com parcialidade ao condenar Lula no caso do triplex do Guarujá, investigação no âmbito da Operação Lava Jato no Paraná.
Os demais ministros já votaram, e o resultado está 2 a 2. Em tese, o voto de Nunes Marques, sem data para ser apresentado, seria o decisivo.
Mas Cármen Lúcia e Edson Fachin, que já votaram no início do julgamento, em dezembro de 2018 — ambos contra o pedido de suspeição — anunciaram que farão uma nova manifestação de voto, o que poderá alterar o placar. Há expectativa de que a ministra mude o entendimento anterior — até o final de um julgamento, qualquer ministro tem direito de mudar o posicionamento.
O julgamento desta terça foi motivado pela decisão do ministro Edson Fachin em relação às condenações de Lula. Nesta segunda-feira (8), Fachin anunciou a anulação das duas condenações do ex-presidente pela 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba, responsável pela Operação Lava Jato.
Em decorrência das condenações anuladas, Fachin declarou extintas, por "perda de objeto", as ações que questionavam a parcialidade de Moro.
Mas a Segunda Turma já havia começado a julgar uma dessas ações, em novembro de 2018. Na ocasião, após os votos de Fachin e Cármen Lúcia, Gilmar Mendes pediu vista e, desde então, não tinha apresentado o processo novamente para julgamento.
Diante da decisão de Fachin de extinguir os processos que questionam a imparcialidade de Moro, com a qual não concordou, Gilmar Mendes levou o caso para a turma nesta terça-feira, a fim de dar continuidade ao julgamento.
Voto de Gilmar Mendes
Ao votar, Gilmar Mendes afirmou que Sergio Moro agiu com parcialidade ao condenar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
De acordo com o voto de Gilmar Mendes, devem ser anulados todos os atos praticados por Moro contra Lula no caso do triplex, inclusive na fase de investigação. Segundo o voto do ministro, uma nova investigação pode ser iniciada. Mendes condenou ainda Moro ao pagamento de custas do processo, em valor a ser calculado.
Para Mendes, houve um "conluio" entre Moro e os procuradores que atuaram na força-tarefa da Operação Lava Jato, o que, segundo ele, maculou o processo.
Segundo o ministro, as mensagens mostram que houve um acerto entre o juiz e os procuradores para resultar na condenação de Lula.
O ministro disse que não se combate o crime cometendo crime e cobrou correção de rumos da operação ao longo dos anos.
“O resumo da ópera é: você não combate o crime cometendo o crime. Você não pode se achar o 'ó do borogodó'. Calcem as sandálias da humildade. Eram as palavras daquele que vos fala em dezembro de 2016 na presença dos procuradores da Lava Jato, inclusive do juiz Sérgio Moro”, afirmou Mendes.
O ministro apontou "a absoluta contaminação da sentença proferida pelo magistrado resta cristalina quando examinado o histórico de cooperação espúria entre o juiz e o órgão da acusação".
Voto de Lewandowski
Embora Nunes Marques tivesse antes solicitado vista, o ministro Ricardo Lewandowski pediu para apresentar o voto ainda na sessão desta terça.
Ele acompanhou o voto de Gilmar Mendes. Ele votou pela nulidade integral de todos os atos no caso do triplex, desde o início das investigações, sem possibilidade de que sejam validados.
O ministro afirmou que a perícia realizada pela Polícia Federal não apontou indícios de que as mensagens apreendidas pela Operação Spoofing — que mostram diálogos entre Moro e procuradores — tenham sido manipuladas pelos hackers que invadiram os celulares das autoridades.
Lewandowski afirmou que elementos de convicção revelaram a "incursão heterodoxa" de Moro e escancararam a confusão entre a conduta de julgar e acusar. Para o ministro ficou configurado no caso um "evidente" abuso de poder.
“Restou escancarada uma devida confusão entre as atribuições de julgar e acusar por parte do então magistrado Sergio Moro. E o pior, confusão esta motivada por razões mais do que espúrias. Sim, porque todos os desdobramentos processuais, concomitantes e posteriores, levam ao inexorável desenlace no sentido de que o ex-juiz extrapolou a não mais poder os limites da função jurisdicional da qual estava investido, neutra e imparcial por definição, ao assumir o papel de verdadeiro coordenador dos órgãos de investigação e acusação, em paralelo à função de julgador. Ficou patenteado o abuso de poder”, afirmou.
Argumentos da defesa de Lula
Na ação a defesa de Lula argumentou que Moro atuou de forma parcial na ação que levou à condenação do ex-presidente pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro referentes ao triplex em Guarujá (SP) e aos demais processos aos quais ele responde em Curitiba.
Os advogados usam como argumento o fato de Moro ter recebido e aceitado convite para integrar o governo Bolsonaro, como ministro da Justiça. Para os advogados isso revela que ele teria agido durante todo o processo com motivação política.
Segundo a defesa, o Brasil assinou tratados internacionais que estabelecem diretrizes para a atuação do Estado e que asseguram o direito a um processo justo, de acordo com a lei e conduzido por juiz imparcial.
Para a defesa de Lula, isso não ocorreu com o ex-presidente. Os advogados dizem ainda que houve "manifestas ilegalidades e arbitrariedades" contra o Lula com o objetivo de afetar a imagem e a reputação dele naquele período. Como exemplos, mencionou a condução coercitiva para depoimento, buscas e apreensões, interceptações telefônicas e divulgação de parte do conteúdo das conversas interceptadas.